EM
UM NOITE CHUVOSA COMO ESTA, HÁ 50 ANOS,
EM VITÓRIA DO MEARIM...
EM VITÓRIA DO MEARIM...
Texto:
Washington Maciel cantanhêde
Momentos
relevantes das nossas vidas, individualmente, e da vida das comunidades,
comumente, passam batidos, sem o devido registro para a história, porque, sob a
pressão do dia a dia, acabamos nos esquecendo da sua importância.
Tendo
presente o simbolismo que o dia 30 de janeiro adquiriu para Vitória do Mearim
há exatos 50 anos - o que só agora, passadas cinco décadas, se pode avaliar
concretamente -, não posso deixar de fazer o registro: atinge nesta noite o seu
cinquentenário o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Vitória do Mearim.
Fundado
pelo meu pai, Antônio Duarte Cantanhede, imediatamente aclamado presidente,
mercê do seu inegável carisma, e mais 29 cidadãos vitorienses de boa cepa,
quase todos aliando o ofício da agricultura a outras profissões que, juntas,
garantiam o pão de cada dia, o STRVM foi mais um fruto do idealismo do grande
vitoriense Arthur Macário Lopes Gonçalves.
O
Monsenhor, capelão da Polícia Militar do MA, que tantos outros benefícios fez a
Vitória, notadamente nos campos educacional (CNEC) e assistencial (Hospital e
Maternidade Aliete Belo Martins, nossa primeira casa de saúde), foi quem
"vendeu" a ideia do sindicato ao afilhado Antônio Cantanhede, à época,
por sinal, seu vizinho na Praça Rio Branco. O padrinho esteve orientando,
quando não apoiando, o afilhado, meu pai, praticamente durante todo o tempo de
sua permanência à frente do STRVM, de 1970 a 1983.
Disso
resultou, por exemplo, assistência de saúde para os sindicalizados e seus
dependentes no gabinete odontológico, então adquirido e localizado na própria
sede da entidade, e no Hospital e Maternidade; apoio para que o Sindicato
obtivesse da Legião Brasileira de Assistência (LBA) a sede própria que até hoje
tem (Praça Cônego Eliud Nunes Arouche); e orientação para que a entidade
obtivesse do Ministério da Educação a maior quantidade de bolsas de estudo já
distribuída em todos dos tempos em Vitória do Mearim, com as quais muitos
jovens se mantiveram estudando, inclusive depois de sair de Vitória, por vários
anos.
A
esses homens - Arthur Lopes Gonçalves e Antônio Duarte Cantanhede - presto
nesta noite as minhas sinceras e comovidas homenagens.
Padre
Arthur deixou a vida terrena em 1995. Há 20 anos, é patrono de uma das cadeiras
da Academia Arariense-Vitoriense de Letras; e, hoje, patrono de cadeira da
Academia Viroriense, fundada em 2019. Meu pai permanece conosco (hoje mesmo,
aqui comigo, em São Luís), com a saúde um tanto fragilizada, mas com quase 92
anos de fortes e edificantes exemplos de como deve ser devotado um homem
público à sua gente.
Tenho
orgulho de ter convivido com Padre Arthur por certo tempo. Tenho orgulho da
história do meu pai, homem simples, mas realizador, vivendo hoje o ócio de mais
de 90 anos sem débitos com a humanidade, graças a Deus!
Mas
tenho orgulho também de ter visto de perto a evolução do STRVM. Seus 30
fundadores - entre os quais, meu tio João Cantanhede, Pedro Pereira Cabral,
Francisco Ramos Cabral, Walmir José Rodrigues, Deodato Santos, Raimundo Costa
Aragão, Vicente Antônio Gonçalves, Luiz Velez Gomes, Balbino Raimundo Fernandes
e Benilde Cantanhede Costa - aos quais imediatamente se juntaram homens como
Pedro Policarpo de Alencar, Crescêncio Laudelino Marinho, Elpídio Anselmo Marinho,
Lucas Evangelista Marinho, José Ferreira da Silva; e, logo depois, Raimundo
Rodrigues Rosa etc. (na sua maior parte, falecidos) são nomes que, de tanto
ouvir em criança, jamais se apagarão da minha memória.
Para
mim, são heróis, homens que acreditaram num sonho tão improvável (era um tempo
de regime de exceção, com a cidadania asfixiada), sonho materializado em uma
ata lavrada naquela noite, possivelmente chuvosa como a de hoje, de 30 de
janeiro de 1970, na sala de jantar do sobrado da família Gonçalves Maciel, sito
na Praça Rio Branco, onde morávamos e onde vivi os primeiros sete anos de vida,
por serem os meus pais, naquela quadra, os responsáveis pelo imóvel.
Eram
aqueles homens lavradores também criadores, vaqueiros, pedreiros, músicos,
alfaiates e profissionais de vasto leque de ocupações, pois não se vivia só de
um "ofício" ou de uma "arte" naquele tempo.
O
STRVM, porta de entrada para a aposentadoria do trabalhador rural da nossa
terra, como, de resto, eram todos quando esse benefício surgiu, em 1971, depois
foi tomando rumos menos assistenciais e
mais classistas/reivindicatórios, fruto das pressões sociais por justiça no
campo e da abertura democrática do país. Meu pai mesmo ainda formalizou junto
ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária pleitos de
desapropriações de importantes áreas rurais, algumas deferidas, como Mata do
Boi, resultados colhidos de par, embora nem sempre lado a lado, com a luta dos
próprios posseiros in loco .
Hoje
enfrentando dificuldades oriundas de uma certa visão esganadora dos movimentos
sociais, espraiada pelo país a partir do círculo central de poder, como os
demais sindicatos brasileiros, o STRVM pode, entretanto, cantar vitória por
esses 50 anos de luta e conquistas para a humilde classe dos lavradores vitorienses,
inclusive pela visibilidade política que antes não tinha, que resultou na
eleição de vários dos seus líderes para representá-la na Câmara Municipal,
tendo sido meu pai o primeiro deles, eleito em 1976 com a maior votação até
então obtida por um vereador, e reeleito em 1982.
Parabéns,
nesta noite, a todos os que fizeram essa história!
São
votos de quem ensaiou os primeiros passos na vida pública, que resolveu seguir,
vendo e admirando a caminhada reta e frutuosa do seu pai no meio do povo de
Vitória do Mearim, juntamente com os seus amigos de todas as horas.
Conjunto
Planalto Vinhais, noite chuvosa de 30 de janeiro de 2020.
(Washington
Luiz Maciel Cantanhede)
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