José Augusto Silva
Oliveira (*)
Sacerdote, professor, educador, pesquisador, historiador,
político e escritor, o Monsenhor Clodomir Brandt e Silva, o Padre Brandt, nome
com que se tornou conhecido, nasceu em Colinas, MA, a 22 de novembro de 1917.
Filho de Sebastião Gonçalves Silva e Carolina (Sinhá) Brandt e Silva, era o
quinto de uma família de nove irmãos. Residiu em Caxias e ingressou no
Seminário Santo Antônio, em São Luís, em 1932, ordenando-se padre em 1ᴼ de janeiro de 1943, na catedral
metropolitana, por D. Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta. Em discurso
pronunciado naquela data, por certo pontilhado de extrema emoção, faz-se destacar:
E hoje, que consoladora verdade, fui
ungido para o serviço do altar, para a corte de Deus, para o ministério do
Altíssimo. Que grandeza! Que esplendor! Que bondade do Pai Onipotente! Fazer de
um pobre e fraco homem, cheio de misérias e pecados, um seu sacerdote, um seu
ministro, um outro Cristo! Meu Deus, como avaliar a alegria imensa e a
exultação incomparável que vive no meu coração a alargar os horizontes da minha
vida sacerdotal.
No dia 2 de janeiro de 1943, um dia
após sua ordenação, Pe. Clodomir celebrou sua primeira missa, na Igreja de
Santo Antônio, ao lado do Seminário. No dia 3, recebeu sua primeira provisão,
assumindo como vigário a Paróquia de São Vicente de Paulo, no João Paulo. Em
seguida, foi substituto do capelão da Santa Casa de Misericórdia, Monsenhor
Arias Cruz, ocasião reservada a ele pelo destino para assistir aos últimos
momentos de enfermidade de seu pai Sebastião, dando-lhe o conforto e a alegria
de participar de uma missa do filho, a quem tanto desejara ver ordenado padre, antes
de morrer, a 6 de março daquele ano.
Um ano depois de sua ordenação, foi
então nomeado vigário de Arari. Partiu em lancha, saindo da rampa Campos Melo
em 1ᴼ de janeiro de 1944, rumo ao desconhecido geográfico, humano e espiritual,
conforme suas palavras, chegando a Arari no dia 8, logo tomando posse da
paróquia, celebrando sua primeira missa no dia 9, iniciando rapidamente sua
missão naquela terra, apostolado de mais de meio século de abnegado
empreendimento cristão e exercência de amor ao próximo.
Além do zelo extraordinário como
sacerdote, Clodomir Brandt tomou como prioridade a educação. Começou com dois
alunos, uma pequena mesa e três cadeiras, em um dos cômodos da casa que
primeiro o recebeu, que logo se tornou pequeno, obrigando-o a transferir-se
algum tempo depois para um imóvel alugado com a chegada de novos alunos. No dia
15 de fevereiro, ainda de 1944, fundou o Instituto Nossa Senhora da Graça,
colégio para alunos do sexo masculino. Em 10 de junho de 1945, organizou e
instalou uma entidade benemérita a que denominou de Associação da Doutrina
Cristã – ADC. Dividiu a ADC em quatro secretariados: Assistência e Promoção
Humana; Educação; Catequese e Evangelização; e Cultura, objetivando a promoção
do homem em todas as suas manifestações de vida.
Em 1947, fundou o Instituto Bom
Jesus dos Aflitos, colégio para meninas. A boa fama do ensino propagou-se por
todo o Estado e, não raro, chegavam alunos de outras regiões. O internato,
segundo palavras de Diana Brandt, sua tia, e de Carolina (Sinhá) Brandt e
Silva, sua mãe, que também dedicaram anos de suas vidas no controle da casa e
dos internos, tornou-se famoso no Maranhão e além deste, pelo rigor, não
somente dos estudos, mas também por correções de comportamento para a vida,
buscando a formação de verdadeiros cidadãos.
Em 1964, instalou o Ginásio
Arariense. Em 1965, fundou o pré-escolar Jardim de Infância Menino Jesus. Em
1969, criou a Escola Normal de Arari e, em 1992, o 4ᴼ Ano Adicional.
Atualmente, este complexo educacional tem a denominação de Colégio Arariense.
Tudo isto feito à custa de muito sacrifício, em muitos casos com recursos
próprios, do seu sustento. Ergueram-se capelas, o colégio se ampliou, surgiu
uma biblioteca pública, uma cooperativa, uma escola de artes gráficas, uma
escola de música, uma escola de corte e costura, um escola de carpintaria, um
jornal semanal Notícias, uma
livraria, um laboratório, um ambulatório... Outras coisas foram surgindo e o
patrimônio da paróquia de Arari passou a contar como um dos maiores da Igreja
do Maranhão.
Foi um mestre infatigável, um
educador sem rival e pioneiro na região. Sem dúvida, a história da educação
maranhense, do século XX, não poderá ser contada sem que se faça referência ao
Monsenhor Clodomir Brandt e Silva, como afirma José Fernandes, historiografando
o Padre Brandt e sua obra redentora (Caderno A, jornal O Estado do Maranhão, de 26 de abril de 1998). A propósito, quando
José Fernandes propôs o nome do Pe. Brandt para sócio correspondente do
Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM, inusitadamente fora
dispensado o parecer da Comissão Técnica, exigência do regimento da Casa,
merecendo aprovação imediata e unânime, demonstração de inequívoca satisfação
em ter o pároco de Arari entre os membros daquele sodalício.
Como pesquisador, historiador e
escritor, em meio a tantas atividades, arranjou tempo para escrever vinte e
sete livros – romances, teatro e ensaios, inclusive a história de Arari, a
genealogia de seus primeiros moradores e da própria família, trabalhos
publicados pela Editora Notícias de Arari, também por ele criada. Em Folha caída, minha dor (1989), primeiro
romance, relata a história realística do homem do campo, sem terras para
plantar, expulso por donos ou pseudo-donos, uma
contribuição para o estabelecimento da paz no meio rural em permanente estado
de guerra podre, conforme prefacia.
Antecedendo esta publicação,
denuncia em Notícias, de 6 de
dezembro de 1980: Quando se anda pelo
interior do município, através de rústicas estradas de barro, esburacadas e
poeirentas, o que se vê de espaço a espaço, são as ruínas de casas, na quase
totalidade de palha, casas que foram abandonadas, destruídas ou queimadas...
Para onde foi o povo que sofreu a violência? Foi para as cidades, formar o
cinturão de pobreza e de aspirações que desafiam as autoridades com soluções
que nunca chegam. Casas abandonadas, restos de casas, lugares de casas,
símbolos da injustiça e da opressão. Nos romances que se seguem, Os caminhos de Silvânia (1984); Arnaldo (1988); Luzia dos olhos verdes (1ᵊ ed. 1991; 2ᵊ ed. 1997) exercita o
conhecimento da realidade interiorana, retratando experiências religiosas,
culturais e sociais. A semente que cresceu entre espinho (1989),
texto para teatro, não é história – é uma interpretação de fatos sociais usando
protótipos que podem estar encarnados em pessoas que são da História.
Jornalista e orador fluente utilizou
principalmente o púlpito para o exercício dos seus dons de oratória. Exercendo
intensa atividade político-partidária, por mais de trinta anos, conquistou
adeptos fiéis e adversários inflexíveis. A sua atuação política, além de
polêmica, foi mesclada por lances dramáticos, mormente quando combateu as
forças do vitorinismo. Líder absoluto na região, durante considerável número de
anos, elegeu deputados em duas legislaturas somente com votação própria. Elegeu
quatro prefeitos do município de Arari e a si mesmo vereador majoritário por
três vezes.
Viveu sem multa comodidade ou
conforto material maior, missionário de uma pequena cidade do interior maranhense,
junto do povo simples, a quem se unira pelos laços do amor. Sobre ele, o
imortal D. José de Medeiros Delgado, fundador da Universidade Católica, da qual
se originou a atual Universidade Federal do Maranhão, quando arcebispo
metropolitano de São Luís, escreveu um trabalho retratando sua personalidade, a
que deu o título de Pobreza Sorridente.
Todo o seu trabalho realizado e vivido com intensidade foi sustentado no lema
por ele criado: Vim para servir. Para
ele também são as palavras de São Paulo: Combati
o bom combate, cheguei ao termo de minha carreira, guardei a fé. Desde agora me
está preparada a coroa de justiça que o Senhor me há de dar em prêmio (2
Tm. 4,7). Faleceu na manhã ensolarada do dia 22 de abril de 1998, aos 81 anos
de idade. César Abbas Prazeres, em artigo publicado pelo jornal O Estado do Maranhão, de 29 de abril de
1998, expressa um grande desejo do Pe. Brandt: Daqui não sairei. Morrerei com as garras presas à minha Igreja e a este
povo. Seu corpo repousa na nave central da Igreja de Nossa Senhora da
Graça, em Arari, MA.
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(*) Professor,
Ex-Reitor da Uema, Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do
Maranhão (IHGM), Membro Fundador da Academia Maranhense de Ciências (AMC) e
Membro Correspondente da Academia Arariense-Vitoriense de Letras (AVL).